AGOSTINHO DA SILVA
ARAUTO DE UM MUNDO EM EXPANSÃO
J. Jorge Peralta
I - UM PARADIGMA DO MUNDO LUSÓFONO
1.
Agostinho da Silva, na sua visão profética e dinâmica
da história, sonhou sempre com um mundo melhor para todos. Foi um homem
apaixonado pela vida; um cidadão do mundo.
Foi um português da estirpe dos grandes construtores da nacionalidade
e dos grandes descobridores do mundo; Foi um bandeirante,
no arrojo e na ousadia de suas ideias, e na competência e coragem de
praticá-las.
Foi um homem
plural, como Fernando Pessoa. Via a essência do ser português.
Personificou a alma lusa. Agostinho da Silva foi, como Pessoa, um indisciplinador
de almas, um decifrador de enigmas, um provocador
de pessoas, para que elas próprias achassem e construíssem o
próprio caminho.
Foi
descobrindo as grandes forças que regem os destinos
da humanidade, superando egoísmos e desvendando dúvidas
e inquietações.
Agostinho
focou-se nas forças que impelem o espírito
da lusitanidade: a identidade, com alteridade,
articulada com a cordialidade e a tolerância.
Levou essa equação a todas as dimensões
da vida.
Essa equação
possibilitou que os portugueses dessem novos mundos ao mundo, nos
séculos XV, XVI e XVII.
Só o espírito
lusitano poderia viabilizar a imensa epopéia dos descobrimentos de
novas terras e o relacionamento cordial com novas gentes.
O espírito
dos descobrimentos é a marca do povo português, que
ainda perdura. Foi a força motriz de Agostinho.
Essas forças
ainda impulsionam os descobridores dos tempos modernos, pelos tempestuosos
mares interiores, numa perspectiva espiritualista.
Agostinho foi
um homem de uma lucidez extraordinária: um visionário. Sentiu
as dimensões permanentes e ainda atuais das forças matriciais
que levaram a cultura e a língua portuguesa pelos quatro cantos do
mundo, sentiu a força estupenda que sustenta e impulsiona a Lusofonia,
no contexto da modernidade.
Sem nostalgias,
ele procurava abrir novos caminhos de esperança, pelo cultivo e defesa
de valores do mais autêntico humanismo, superando valores espúrios
e mascarados.
2.
A Identidade e Alteridade são as forças motrizes
que fizeram de Agostinho um arauto da esperança,
um otimista, um homem cheio de vida, um cavaleiro da esperança.
Um homem que creditava
na vida e que irradiava vida e esperança, em todos que dele se aproximavam.
Um homem sem arrogância e sem vaidades vazias; um homem humilde que
sabia onde estava a grandeza da pessoa humana: no seu caráter, na sua
generosidade e benquerença, sem hipocrisia e sem farisaísmos...
Foi um homem de portas e coração aberto para todos.
Diziam que ele
tinha um coração maior que o mundo.
Diz Agostinho:
“Temos
de aprender duas coisas:
Aprender
quão extraordinário é o mundo
e
aprender a ser bastante largo, por dentro, para o mundo todo poder entrar”
(1)
Agostinho foi
um homem de grande visão; acreditava na educação
séria, como o caminho para superar a miséria e as mazelas
sociais.
Na perspectiva
em que coloca seu pensamento, seus sentimentos e sua ação, Agostinho
comporta-se como um homem universal. Atrai, a si, pessoas
de todas as filosofias, ou atitudes políticas. Todos o ouvem, com atenção
e receptivamente. Assim é até hoje, e será por muito
tempo. Personificou o espírito da Lusofonia.
3.
Agostinho foi uma pessoa afirmativa e positiva.
Como Sócrates,
não dava soluções: ensinava as pessoas a encontrá-las;
provocava; inquietava e mostrava caminhos. Apontava, mas não fazia
caminhos para ninguém. Respeitava a liberdade e a competência
de cada um.
Assim as pessoas
cresciam pelo próprio mérito, e conseguiam forças para
crescer mais. Agostinho não dava o peixe a quem tinha fome, a não
ser excepcionalmente; dava o anzol e ensinava a pescar. Foi um criador de
pessoas livres e altruístas.
Em toda a sua
vida, Agostinho foi um homem sincero, coerente e leal a seus princípios
humanísticos. Foi um amante da liberdade. Ele é uma mensagem
viva. Nele o saber e o fazer, o pensar e o querer estavam plenamente articulados.
Foi um educador
(ex-ducator = tirar de dentro). Nunca quis fazer discípulos. Quis um
mundo de pessoas livres. Por isso dizemos que Agostinho é um arauto
de um mundo melhor, um paradigma da Lusofonia.
II – PERFIL DE UM HOMEM REALIZADOR
4.
Agostinho foi um homem dedicado, competente e empreendedor.
Foi um homem determinado
e de grandes ideais. De tão simples, sua atuação e a
sua vida, nada tinham, na aparência, que revelasse nele mais que um
homem comum. Nele, nada segue os códigos de grandes feitos espetaculares,
cinematográficos, com apelo a “efeitos especiais”, irreais,
a que nos acostumamos no nosso mundo mediático, onde vale mais o que
parece e aparece do que a essência do que se é.
Por fora foi sempre
um típico homem simples, cordial e generoso. Por dentro teve uma alma
de gigante.
Agostinho foi um extraordinário homem comum.
5.
Pertenceu a uma geração que deu ao mundo, em nosso meio, grandes
sábios, com idênticas marcas. Aqui destacamos: Jaime Cortesão,
Leonardo Coimbra, Teixeira de Pascoaes,
Guerra Junqueiro, Antero de Quental e Fernando
Pessoa. Juntamente com Agostinho, todos cultivaram idênticos
ideais humanistas, altruístas e lusófonas, em perspectivas plurais
e universais. São pessoas que somam e multiplicam forças, solidários
nos princípios matriciais que os inspiram.
Na Espanha destacamos
Miguel de Unamuno e Ortega y Gasset, muito
bem relacionados com Portugal.
Desta estirpe
encontramos, pelo país, milhares de Pessoas. Elas
se distinguiram pela genialidade, que os fez Paradigmas; por uma vida dedicada
ao bem-comum e por um espírito de sinceridade, simplicidade e entusiasmo.
Caracteriza-os
uma visão franciscana da vida e do mundo e um pensamento
sólido, profundo, consistente e ousado, numa religião para além
das igrejas, com liberdade interior.
“Para essa
“geração”, São Francisco é o São
Paulo de uma nova igreja dos simples, diz Eduardo Lourenço.
Eram pessoas de espírito socrático: sábio, altruísta,
simples e desprendido. Eram pessoas de altos ideais, como o Cristo do Evangelho,
voltados ao bem comum...
Pensar em Agostinho,
é, um pouco, sentir uma sombra de São Francisco, passando lépido,
com seu bordão...
Sempre peregrinando
por um mundo a descobrir e a reconstruir.
Pensou em perspectivas
universais, onde cabem todas as contribuições, sem discriminação.
Foi um homem que
acreditou que é possível construir um mundo melhor.
Olhou o mundo
como algo, em permanente processo de construção e reconstrução:
algo sempre a haver, ao abrir-se para novas perspectivas dinâmicas.
Foi um homem
de pensamento e um homem de ação;
um pensador consistente e um realizador coerente.
Pensar, querer
e realizar era sua plataforma de atuação.
6.
Agostinho foi um homem aberto a tudo: aberto para a vida,
para as energias do universo, que nele se integram por todos os sentidos:
pela visão, pela audição, pelo tato, pelo olfato e sabor,
e todos os mais que houver.
Dentro dele, de
seu espírito, de sua alma, havia lugar para tudo e para todos. O que
tinha: (saber, sabedoria e até seus bens), tudo repartia e compartilhava.
Amava e cultivava a vida.
A
sua visão do outro, da alteridade,
integrava-se no seu ser, na sua identidade. Vivia para o
“outro”. Foi um educador pleno. Um ser humano pleno, um homem
cativante, por suas ideias, modo de vida e visão de mundo.
Foi um homem de
pensamento e de ação: um construtor; um transformador
de vidas, um iluminador de caminhos. Foi luz, onde passou.
Para levar a teoria,
à prática, foi um criador de universidades e um exímio
professor.
Foi um homem cheio
de vida, e se realizou na convivência ativa
e dinâmica. Nada lhe faltava, porque tudo repartia... Isto parece paradoxal,
mas, nele, é bem real. Foi o típico homem consciente: o cidadão
do mundo.
Foi um homem sem
máscaras. Por isso as pessoas não tinham receio de a ele se
dirigirem, como quem se dirige a um amigo, sempre de portas abertas.
Dentro do espírito
lusitano, que era sua força matricial, foi um homem de perspectivas
universais
III – ABRINDO CAMINHOS – REFLEXÃO E AÇÃO
7.
Nasceu em 1906, no Porto... Em 1944, com 38 anos, emigra para o Brasil, para
prosseguir a sua obra, buscando novas oportunidades. Teve-as.
Aqui, a sua vida
toma novas dimensões e novos rumos.
Aqui, Agostinho
da Silva pôde realizar suas perspectivas universais,
da vida e da mente típica portuguesa.
Sua personalidade
de pensador, místico e mestre encontra aqui um campo
fértil. Sua missão de professor e seu humanismo e dedicação
às grandes causas da humanidade, sem distinção de classe
ou de nível sócio-cultural, aqui germinaram. O espírito
brasileiro combina muito bem e enriquece e dinamiza o espírito
lusitano.
Foi um Semeador.
Quem dele precisou foi atendido. Semeou para as próximas gerações
colherem. Semeou rabanetes para as próximas refeições
e semeou jacarandá para as futuras gerações.
Sua vontade e
disposição para o trabalho, para servir o país
de adoção, fizeram dele, como diz Eduardo Lourenço:
“o
homem dos sete ofícios, profeta, pedagogo, sábio, naturalista
(...)
um
pólo de vida ativamente contemplativa ”.(2)
Fez
amigos, por toda a parte onde atuou, de Norte a Sul do país.
Em tudo o que
pôs as mãos e o seu ideal, agiu como
fermento transformador.
Onde esteve, fez
a diferença, ajudando a abrir novas perspectivas e novos rumos
às pessoas e às instituições onde atuou.
Este homem extraordinário,
além de professor e foi um pai de família. Com esta repartia
também a sua vida, a sua sabedoria e a sua generosidade.
8.
Uma das marcas deixadas por Agostinho foi seu carinho pela
cultura portuguesa e pelo mundo lusófono.
Ajudou a formar
Centros de Estudos Portugueses, em diversas universidades
em diversos Estados do Brasil.
Em 1954 é
nomeado Diretor dos Serviços Pedagógicos da Exposição
Histórica do IV Centenário da cidade de São
Paulo, onde seu sogro Jaime Cortesão desenvolveu um
trabalho extraordinário.
Em 1959, funda
o Centro de Estudos Africanos e Orientais, na Universidade
Federal da Bahia. Uma instituição inovadora, revolucionária,
dentro do espírito de Gilberto Freire: visão
de um País e de uma lusofonia multiracial e plural.
Com isto Agostinho deu sequência aos trabalhos pioneiros de Gilberto
Freire e Nina Rodrigues, valorizando e fazendo justiça
às ricas contribuições que os negros trouxeram à
cultura do Brasil (3)
Começa
aqui a pôr em prática o sentido plural da lusofonia.
Quis mostrar a necessidade de se dedicar mais aos Estudos Africanos,
por sua presença marcante da Lusofonia.
Deu destaque à
vertente africana da lusofonia. Abriu um portal de amplas
perspectivas.
Agostinho foi
um espírito de convergência. Ia abrindo novos espaços
que expandiam e articulavam as suas ideias matriciais, dando-lhes novos horizontes,
multiplicando-se. Nunca se dispersou.
9.
Em 1963, visita o Japão, Macau e Timor, com bolsa
da UNESCO.
De volta a Portugal
(1975) visita a Galiza.
Em 1987, visita
Olivença, onde deixou marcas de seu gênio e de sua generosidade.
Em 1988, visitou
Moçambique.
Com sua atividade
múltipla e pelo Espírito de União dos Povos Lusófonos,
com que sempre trabalhou, Agostinho lançou as sementes férteis
da Lusofonia pluricontinental, em perspectivas universais,
na perspectiva do Quinto Império, sob as luzes do Divino Espírito
Santo, Agostinho deu novas e amplas perspectivas à Lusofonia Mundial.
10.
Agostinho foi o verdadeiro inspirador da criação da
CPLP: a união de povos soberanos: unir-se para crescer e prosperar,
nas dimensões materiais e espirituais.
O objetivo era:
Unir-se para superar
o subdesenvolvimento e as decorrentes chagas sociais e as chagas da guerra
civil.
Unir-se para superar
antagonismos, aceitando a diversidade.
Unir-se para reencontrar-se
com o progresso, consigo mesmo e com os seus amigos.
Unir-se para dar
uma educação melhor a todo o povo.
Unir-se para,
juntos, construirmos um futuro melhor, sem abdicar da liberdade.
Unir-se para produzir
mais alimentos e mais riquezas para a nação e emprego para todos
poderem alimentar-se e alimentar suas famílias.
Unir-se para construir
uma nação próspera, com o bem-estar do povo
Unir-se para saber
ir além do progresso material, superando e ultrapassando o economicismo
capitalista, cultivando os valores humanos e o bem-estar de todos.
Agostinho deu
contribuição destacada às ideias matriciais da Lusofonia,
em toda a sua amplitude e complexidade.
Agostinho ajudou
a dar unidade ao mundo da Lusofonia, dando a cada povo o seu valor, sem discriminações.
Semeou o espírito
da confraternização. Fez o que todos podem fazer, se quiserem...
Somou suas ideias
e sua ação, às ideias e ações de milhares
de outras pessoas inspiradas, que germinam nas terras férteis da Lusofonia,
dando-lhes novas forças. Suas ideias não se caracterizam pelo
ineditismo, mas pela operacionalização e articulação
de novas forças, e pelo espírito que as fecundou. ele faz acontecer.
Sua visão
de mundo passa pela confraternização de todos os povos, com
a instauração do quinto Império Espiritual, na busca
de um mundo com mais justiça, generosidade, prosperidade material e
espiritual e mais paz.
Por estes posicionamentos
de Agostinho, dizemos que ele foi um “arauto de um mundo em expansão”,
preconizando uma nova era da humanidade.
________________________
(1) AÚltima Conversa p. 96
(2) Idem.Ibidem
(3) Destaque especial merece, nestas perspectivas, a obra-prima: "Casa
Grande e Senzala", publicado em 1931
Nota: Para completar este ensaio sobre Agostinho da Silva, escute-o no YouTube:
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Agostinho da Silva (clique)
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“Agostinho da Silva, Visão Panorâmica do Homem e sua Ideias”
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